Supremum - Um Jogo de Sombras -T1/E13


O carro seguia pelas ruas escuras e quase vazias de Cosmópolis, os faróis cortando a noite como lanças de luz. Já era tarde. As meninas haviam sido deixadas em segurança em suas casas, mas o silêncio dentro do veículo continuava pesado.

Paulo dirigia mais devagar agora, como se esticar o trajeto fosse uma maneira de ganhar tempo para pensar.

Andrew olhava pela janela, os pensamentos tão turbulentos quanto a cidade que dormia lá fora. Tudo havia mudado. As máscaras haviam caído — pelo menos entre eles.

— Ainda não consigo acreditar que falei tudo pra elas — ele murmurou, quebrando o silêncio.

Paulo lançou um olhar de canto. — Era inevitável. Mais cedo ou mais tarde, a verdade ia aparecer. Mas agora... agora elas sabem. E escolheram ficar.

Andrew soltou um suspiro cansado. — Eu só espero não ter colocado nenhuma delas em risco.

— A gente já colocou todo mundo em risco no momento em que começou a mexer com a Tentáculos.

Andrew virou-se para encará-lo.

— Você tem certeza de que quer continuar com isso?

Paulo sorriu de canto. — Cara, a essa altura... a gente não tem mais volta.

O carro parou num sinal vermelho. Durante um instante, o mundo ficou em suspensão. Sem movimento. Sem som. Só a cidade respirando em silêncio.

— Tem mais uma coisa — disse Paulo, hesitando. — Uma coisa que eu não quis dizer na frente das meninas.

Andrew franziu a testa. — O quê?

O sinal abriu e o carro voltou a se mover. Paulo falou, sem desviar os olhos da estrada:

— Lembra daquele arquivo com as transferências que a gente encontrou? Eu fui mais fundo. Usei uns contatos online pra acessar diretórios escondidos dentro do servidor.

Andrew o olhou, atento.

— E…?

— Um dos documentos que encontrei era da própria Tentáculos. Era uma espécie de memorando interno. Eles citavam um policial de Cosmópolis que poderia atrapalhar as operações da organização. Diziam que ele estava chegando perto demais e que precisavam comprá-lo… ou calá-lo.

Andrew se virou, alarmado. — Um policial de Cosmópolis?

Paulo assentiu, a mandíbula tensa.

— Eu não tenho certeza, mas… o nome não estava no documento, só a sigla "RF". Pode ser coincidência. Ou pode ser o nome do meu pai.

Um silêncio gelado se instalou entre os dois.

— Roberto Farias — Andrew murmurou, ligando os pontos. — Investigador sênior da Polícia Civil. Sempre envolvido nos casos grandes… E agora pode estar no radar de uma organização criminosa.

— Exato — disse Paulo. — Se for mesmo sobre ele, meu pai tá correndo risco e nem faz ideia.

Andrew passou a mão pelo rosto. — Isso complica tudo. Eles podem estar infiltrados na cidade, bem debaixo do nosso nariz. E se sabem quem é teu pai, não vai demorar pra descobrirem quem somos nós.

Paulo engoliu seco, mas forçou firmeza na voz:

— A gente vai proteger ele. E descobrir o que mais esses desgraçados estão tramando.

Ele acelerou um pouco, mas a mente já fervilhava de paranoia e propósito.

— Eu também tô preocupado com a Isadora — Andrew confessou. — Ela é corajosa, mas não tem noção do tamanho da encrenca que a gente tá enfrentando.

— E a Camila é impulsiva. Se souber que tá correndo risco, pode tentar ajudar… e piorar tudo — completou Paulo.

— Acha que devíamos afastá-las disso? — Andrew perguntou.

Paulo hesitou. — Acho que a gente tem que ser sincero. Mas também proteger. Mostrar o que tá em jogo sem envolver elas diretamente.

Andrew assentiu, ainda pensativo.

— E se eles forem atrás dos nossos pais?

Paulo apertou o volante com força.

— A gente não vai deixar isso acontecer. Mas, a partir de agora, temos que ser espertos. Tudo que fizermos… cada passo… tem que ser calculado. Porque se eles forem capazes de ameaçar minha família, eu juro que não vou deixar barato.

O carro virou a última esquina, se aproximando da casa de Andrew. As luzes da varanda estavam apagadas. Tudo parecia tranquilo. Mas havia algo no ar… como uma sombra espreitando, invisível, mas presente.

— Acha que estamos sendo seguidos? — Andrew perguntou, antes de sair.

— Não vi nada. Mas isso não significa que estamos limpos. A partir de agora, qualquer passo em falso pode custar caro.

Andrew abriu a porta e desceu.

— Amanhã cedo me encontra lá em casa. Quero ver esses arquivos.

Paulo assentiu. — Fechado. Mas dorme com um olho aberto, cara. Se essa Tentáculos já sabia de mim… e agora sabe de você…

Andrew fechou a porta com firmeza. — Então eles não fazem ideia do que despertaram.

Com um aceno breve, Paulo acelerou, sumindo pela rua como um fantasma na madrugada. Andrew permaneceu ali por alguns segundos, encarando o céu escuro. Nenhuma estrela visível naquela noite.

Mas ele sentia.

Alguém os observava.
E o jogo de sombras estava apenas começado.

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