Supremum - Sombras do Eclipse - T2/E17

 


LOCAL: Estação São Bento — Metrô Desativado, Centro de São Paulo

HORÁRIO: 02h16 da madrugada

A fumaça pairava no ar como se a própria cidade sangrasse pelas rachaduras. As explosões haviam cessado havia apenas alguns minutos, mas seus ecos ainda vibravam no concreto e no coração dos que sobreviveram. Andrew liderava o grupo por túneis abandonados, agora convertidos em refúgio improvisado para resistir ao Protocolo Final.

Atrás dele, Isadora, Camila e Paulo tentavam se manter firmes, mas o medo era visível. Kira andava em silêncio. Desde o colapso no campus, ela não dissera uma palavra. Número 06 caminhava ao seu lado, vigilante como sempre.

— Estamos quase lá — murmurou Andrew, guiando o grupo por um corredor estreito que levava à antiga plataforma subterrânea. — Se formos rápidos, ainda podemos subir até o nível dois antes que…

Um barulho de metal arrastando interrompeu sua fala. Foi baixo, mas denso. Como lâminas cortando o ar.

Andrew ergueu o braço, os olhos atentos. A íris verde começou a brilhar, como uma fenda radioativa se abrindo. Ele podia sentir... uma vibração familiar. E, ainda assim, errada.

Kira parou de andar. Seus olhos se arregalaram, a respiração travou.

— Não... — ela murmurou. — Isso não pode ser...

Seis já havia se posicionado entre ela e o corredor.

Da escuridão, dois pares de luzes vermelhas surgiram — como olhos de predadores na selva. As silhuetas que emergiram não pareciam humanas. Eram soldados — ou o que haviam restado deles. O corpo coberto por armaduras negras, entre placas metálicas e fios pulsantes de energia escarlate. No peito, estampado com tinta desbotada, o símbolo: E.C.L.I.P.S.E.

— Unidade 01: Leo Archanjo.
— Unidade 02: Caio Ferraz.
— Inimigos detectados. Iniciando protocolo de neutralização.

Kira caiu de joelhos. Uma lembrança a esmagou.


DOIS ANOS ATRÁS

LABORATÓRIO E.C.L.I.P.S.E., LOCAL DESCONHECIDO

— Você roubou minha comida de novo, Leo! — Kira gritava, empurrando o amigo de cabelos castanhos desgrenhados, sujos de graxa.

Leo ria alto.

— Regras da sobrevivência, Kira. Você distrai, eu como.

— E eu que tenho que dividir o quarto com vocês dois — resmungava Caio, deitado com um livro eletrônico antigo sobre neuroengenharia. — Um dia, vamos sair daqui. Vamos ser livres.

Os três se olharam e encostaram as testas, como sempre faziam antes de uma nova rodada de experimentos.

— Sempre juntos — disseram, em uníssono.


DE VOLTA AO PRESENTE

— Leo… Caio… — Kira murmurou, sem conseguir conter as lágrimas. — Lembram de mim?

Nenhum dos dois respondeu. As máscaras de combate cobriam seus rostos, mas os olhos... os olhos vermelhos de programação total não piscavam.

Seis falou em tom grave:

— Eles foram reprogramados. Totalmente. São sombras... e não lembram de nada.

Andrew se posicionou à frente de Kira, a pele começando a brilhar. Seus olhos ardiam em verde vivo, prontos para disparar.

— Não podemos deixá-los se aproximar mais.

Mas Kira o segurou pelo braço, trêmula.

— Por favor... só mais um segundo.

Leo deu um passo à frente.

— A unidade hostil Kira 03 está classificada como instável. Ordem: eliminação imediata.

Caio ergueu o braço. Um canhão de pulso se materializou no lugar da mão.

Samuel gritou:

— Abaixem-se!

Um raio vermelho atravessou o corredor, explodindo parte da parede atrás deles. Andrew reagiu, instintivamente, disparando um raio concussivo verde pelos olhos, que ricocheteou no chão e forçou Leo e Caio a recuarem.

— Eles são poderosos — murmurou Paulo, protegendo Camila e Isadora atrás de uma pilastra.

— São o que nós teríamos sido… — respondeu Kira. — Se eu não tivesse fugido.

Samuel, o Numero Seis, avançou colidindo com Caio. O impacto das armaduras soou como trovões subterrâneos. Caio contra-atacou com força bruta, socando o peito de Seis, que voou contra um trem abandonado.

Leo girou uma lâmina de plasma. Foi direto na direção de Kira.

— Não! — gritou Andrew.

Ele liberou um novo raio pelos olhos, que explodiu o teto acima e fez cair parte dos escombros entre Kira e Leo. Ela caiu de joelhos, atônita.

Andrew se posicionou à frente de todos.

— Vocês vão ter que passar por mim.

O chão tremeu. Não por causa do combate. Mas por algo mais profundo.

Do alto, uma voz ecoou no sistema de comunicação da estação:

— Unidade Eclipse ativada. Protocolo Terminal confirmado. Intervenção autorizada.

Era a voz de Senhor Espectro.

— Estamos cercados — sussurrou Isadora. — Eles sabiam que a gente viria.

Então, algo inesperado aconteceu.

As luzes da estação piscaram e, por um instante, tudo congelou.

Uma figura surgiu na entrada da plataforma. Trajava um casaco escuro, o rosto oculto por sombras. Mas sua presença irradiava conhecimento. Controle.

Kira arregalou os olhos. Camila e Paulo estremeceram.

Andrew olhou na direção da figura.

— Quem é você?

A figura ergueu a mão.

Um raio de energia eletromagnética saiu de seus dedos e atingiu Leo e Caio, que se contorceram, desativando seus sistemas por alguns segundos. Eles caíram de joelhos, ofegantes, as máscaras trincadas.

A figura se aproximou, e pela primeira vez, Seis arregalou os olhos:

— ...Jota?

Doutor Jota parou a poucos metros de Andrew. Não disse nada. Apenas olhou para ele — com uma mistura de dor, orgulho e culpa.

— Quem é você?! — Andrew gritou.

Doutor Jota desviou o olhar. Sua voz saiu baixa, quase inaudível:

— Ainda não é hora, Andrew…

Então ele ergueu o braço e, em um estalo, um feixe de luz envolveu Leo e Caio. Em segundos, eles desapareceram — teletransportados para algum lugar desconhecido.

Andrew correu para frente, mas já era tarde.

Kira caiu de joelhos, chorando.

— Eu… eu podia tê-los salvo…

Samuel colocou a mão no ombro dela. E disse, com uma calma que escondia um vulcão:

— A guerra está só começando.

No fundo da estação, um trem antigo fez um ruído agudo. Seu interior iluminado parecia um chamado.

Andrew olhou para cima, onde rachaduras no concreto revelavam parte do céu negro e estrelado.

Ele sentia. Algo maior estava vindo.

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